14 de nov. de 2011

Black Sabbath: I Tre Volti Della Paura


Black Sabbath: I Tre Volti Della Paura

Por Tânia Souza

Sabe quando você lê um livro e um determinando acontecimento, cenário, diálogo ou ação de um personagem não sai de suas lembranças? Ou assisti a filmes que constroem tão bem a atmosfera proposta que é impossível não se deixar impressionar? Cujas cenas, independente dos recursos e efeitos utilizados, se imprimem na memória? Pois bem, são obras essenciais, aquelas que, para nós, o público, tornam-se cânones, nossas referências artísticas. Seja lá qual o efeito que nos causem, medo, admiração, surpresa, repulsa, humor ou ternura, vão construindo nosso acervo particular. Para quem escreve, essas influências, de uma forma ou de outras, tornam-se marcantes e definitivas.

Revendo alguns filmes que gosto muito, senti vontade de comentar alguns que considero clássicos e extremamente inspiradores para escritores e, por que não, leitores de literatura fantástica, principalmente no gênero terror/horror. Nenhuma obra é totalmente inédita e, consciente ou inconscientemente, somos influenciados pelo que vemos, lemos e vivemos. Esta é, com certeza, umas das minhas influências para o que considero o estabelecimento da atmosfera fantástica, principalmente sombria. E para estreia, nada melhor que um clássico: Black Sabbath: I Tre volti della paura.     

“Aproximem-se, por favor. Tenho algo a lhes contar. Senhoras e senhores, sou Boris Karloff. Estou aqui para apresentar-lhes três pequenos contos de terror e do sobrenatural.”
I Tre Volti Della Paura é composto por três histórias de terror, com aproximadamente trinta minutos cada: "The Telephone" , "The Wurdalak", e "The Drop of Water". Baseado nos contos de Aleksei Tolstoy, Guy De Maupassant e Ivan Chekhov, o filme consegue manter a essência das narrativas sem deixar de inovar.

A primeira boa – ou sombria, no caso - impressão do filme vem do anfitrião: nada menos que Boris Karloff, que também participa do que considero o melhor dos três epsódios: The Wurdalak. A apresentação da obra, unindo trilha sonora, imagens e luz em um jogo de aproximação e distanciamento (o uso do zoom é muito bem explorado na obra), temperada com um tom levemente irônico funciona perfeitamente como primeiro mergulho ao universo expressionista e quase surreal dos contos que virão a seguir.

O Telefone, O Wurdalak e A gota de água representam o melhor do terror italiano, trazendo três diferentes elementos que instauram o medo: suspense, vampiros e fantasmas. Sem deixar de insinuar a força do terror psicológico.

O primeiro episódio, O Telefone, é uma adaptação de um conto de Guy De Maupassant The Telephone, que infelizmente não li. Na verdade, apesar de aparecer o nome de Maupassant nos créditos, há quem diga que o conto é de F.G. Snyder, inspirado superficialmente em um trabalho de Maupassant. Sinceramente, não sei dizer qual a informação correta, mas achei importante mencionar o fato. Se alguém souber onde posso encontrar para ler, agradeço.

A história começa com a chegada de uma jovem mulher a sua residência, no ambiente aparentemente calmo e tranqüilo, soa o toque de um telefone.  O objeto vermelho é o veículo primeiro do terror. A protagonista Rosy é uma bela mulher em uma casa solitária. Ameaças de morte e violência via telefone e a descoberta de um ex-amante que escapou da prisão e pode estar em busca de vingança instauram o pavor, principalmente quando o algoz demonstra, ainda por telefone, saber e ver, detalhadamente, todas as ações da vítima. (Recurso utilizado posteriormente no filme Pânico, se bem que me lembro mais da cena que satiriza do que a original).

O suspense vai crescendo e cada vez que o telefone toca, o medo e as emoções fragilizadas da protagonista evidenciam-se. Desesperada, chama por Maria, uma amiga e, possivelmente, ex-amante de quem está afastada, mas que acredita ser capaz de ajudá-la. O terror psicológico toma forma em um thriller assustador. O clima é de tensão e o jogo de luz e sombras é bem explorado no cenário, conforme as ações e sentimentos da personagem. O desfecho é inusitado e valoriza o suspense. Ciúme, libido, assassinato, vingança e quase nudez são alguns dos elementos explorados. Este parece ser um dos primeiros trabalhos que ficariam conhecidos posteriormente como giallo.

O Wurdulak é o segundo episódio, baseado no conto de Aleksei Tolstoi "La Familia Del Vurdalak”, para quem não leu, está disponível, junto com outros contos maravilhosos, no livro “Contos de Horror do Século XIX”, organizado por Alberto Manguel. Esse conto é perfeito em atmosfera e sugestão, um dos meus favoritos na temática vampiresca. No filme, Boris Karloff é Gorka, o patriarca que, tendo saído para matar um wurdulak, torna-se ele mesmo suspeito de ter se transformado em um cadáver que se alimenta de sangue.
“Antes de partir, meu pai disse... 'Voltarei dentro de cinco dias... mas se voltar após o quinto dia, não me deixem entrar... e atravessem meu coração com uma espada... porque eu também terei me tornado um Wurdulak'. (...) Os wurdulak são cadáveres que têm sede de sangue... o sangue daqueles que mais amaram em vida (...) Quanto mais amaram uma pessoa, mais desejam matá-la... para sugar seu sangue... e quem morre assim também se torna um Wurdulak... até que alguém consiga transpassar seu coração.”

Gorka retorna ao seu lar em uma noite coberta por neblinas e sombras. Recebido pelos uivos insanos dos cães e por uma família que se divide entre o amor, o respeito e o medo, uma tragédia parece anunciar-se. Entre tantos acontecimentos, a belíssima filha de Gorka, Sdenka e o nobre Vladimir D’Urfe, hóspede por uma noite na isolada casa da família, descobrem um sentimento intenso. Sobreviver, fugir ou simplesmente se entregar a uma maldição é o caminho que se apresenta aos protagonistas. Momento angustiante: Ivan chamando pela mãe lá fora e reclamando de frio, sinceramente, uma cena belíssima e comovente. Sem mais detalhes para não ser spoiler. Por que é meu favorito? É um dos mais belos exemplos de que como a atmofera é importante na construção do sentido.

A fotografia é lindíssima. A princípio, nos deliciamos com a delicadeza de um riacho com nuances de sol, planícies e árvores, mas logo um eterno e melancólico pôr-do-sol, marcado por tons em vermelho, violetas e azuis predomina, somente cedendo espaço para a neblina que cobre as noites, moradias e ruínas. O vento constante, os uivos dos cães, os lamentos e chamados dos que já se foram casam-se perfeitamente para estabelecer da atmosfera sombria. Importante destacar que filme desenvolve um enredo diferente do que nos é apresentado no conto, mas os dois, tanto filme quanto o conto, são riquíssimas experiências estéticas.

O terceiro e último episódio é A gota d’água, uma adaptação do conto de Ivan Chekhov. A temática de fantasmas parece compartilhar o espaço, mais uma vez, com o terror psicológico. O que é real ou fruto do medo e da mente nem sempre se diferenciam.

Mais uma vez, o cenário é muito bem explorado. Uma tempestade, trovões, uma condessa morta em meio a uma sessão onde buscava falar com os mortos e a presença de uma enfermeira contratada para vestir a morta compõem a estrutura básica da narrativa. Uma mansão decadente, a sinfonia dos gatos que circulam por todos os espaços, bonecas e miniaturas sombrias são testemunhas do roubo de uma jóia, um belo anel de safira, do dedo do cadáver.

Moscas e zumbidos perturbadores, gotas de água pingando. Vultos, sombras e luzes que se acendem e apagam, assim com uma máscara sombria são elementos que favorecem o crescente terror e o clima tétrico. Em seguida, a vingança da morta, ou da própria mente da enfermeira, toma conta da narrativa.

E para finalizar, não com chave de ouro, pois trata-se de um filme e não de um soneto, mas de forma divertidamente inusitada, Boris Karloff, o anfitrião, está de volta. Em uma tomada irreverente e singular.

Título: Black Sabbath – As Três Máscaras do Terror (Black Sabbath / I Tre Volti de La Paura, Itália/França/EUA.
Direção: Mario Bava e Salvatore Billitteri.
Roteiro: Alberto Bevilacqua, Marcello Fondato, Mario Bava
Produção: Paolo Mercuri, Salvatore Billitteri
Elenco: Boris Karloff, Michele Mercier, Mark Damon, Jacqueline Pierreux, Lidia Alfonsi, Susy Andersen, Massimo Righi, Glauco Onorato, Rika Dialina, Milly Monti
Trilha sonora: Roberto Nicolosi
Gênero: Terror
Duração: 92 min, colorido.
Ano:1963.

Um comentário:

Denir Junior disse...

Oi, Tânia!
Não gosto de Terror, mas você me deixou muito curioso!

Bjos!

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